Leia o texto abaixo e faça um breve comentário sobre o debate entre Sócrates e os Sofistas.
Sócrates e os Sofistas
Em
Atenas, Sócrates não era o único a filosofar. A cidade, com o seu
esplendor cultural e regime democrático, atraía a si estrangeiros que se davam pelo nome
de sofistas.
A
palavra sofista (em grego sophistes) deriva de sophia «sabedoria», e
designa todo o homem que possui conhecimentos consideráveis em qualquer ramo do saber,
nomeadamente gramática, astronomia, geometria, música, entre outras. O sofista era alguém a que hoje chamaríamos
de sábio. Ensinavam tudo o que se podia ensinar, "tinham a pretensão de formar
homens completos, habituados a todas as subtilezas do pensamento reflectido, hábeis em
manejar a palavra, corajosos e fortes na acção, dignos de todos os triunfos, de todas as
felicidades". Landormy (1985:13).
Como,
nesta altura, os jovens atenienses estavam ávidos de novidades, rapidamente os sofistas
se viram rodeados de rapazes desejosos de encontrar o segredo do domínio das multidões.
Os sofistas recebiam pelos
ensinamentos que ministravam, o que era alvo da censura dos atenienses. Também
Sócrates achava "vergonhoso vender o saber, dizendo que
o comércio da sabedoria não merecia menos ser chamado prostituição que o tráfego da
beleza" (Bonnard, 1980:438). Sócrates comparava os sofistas aos
mercadores, que elogiam os produtos que vendem mesmo sem saberem se são bons ou
não. Mas, não será que, como os mercadores que elogiam os seus produtos, também
os sofistas seriam inevitavelmente tentados a acomodar a sua mercadoria ao gosto
dos compradores? Ao receberem pelos ensinamentos ministrados, os sofistas
forçaram o reconhecimento do carácter profissional do trabalho de
professor. Essa é uma dívida que a institucionalização da escola tem para com
eles.
No entanto, ao serem pagos directamente
pelos alunos, ficavam em condições de fazer uma selecção entre os candidatos. Em
geral, preferiam os filhos de famílias mais abastadas. A analogia com o carácter
selectivo da escola dos nossos dias é aqui tristemente visível.
Ao contrário dos sofistas,
Sócrates não recebia pagamento pelo que ensinava. Dispensava gratuitamente o seu saber a
quem dele necessitava. Contudo, foi considerado por muitos como sofista porque
aparentemente exercia o mesmo ofício. Como eles, instruía a juventude, discutia em
público política e moral, religião e por vezes arte e, como eles, criticava com vigor e
subtileza as noções tradicionais nas diferentes matérias. Como diz Bonnard (1980: 439),
ele era o "príncipe dos sofistas, o mais insidioso dos corruptores da juventude.
O mais culpado também: os outros são estrangeiros, ele é cidadão" .
A sua motivação de ordem
pedagógica distingue-se ainda da dos sofistas, na medida em que estes, praticavam um
ensino desligado de preocupações de ordem ética. Como diz Landormy
(1985:15), fingiam "adoptar as opiniões comuns, a moral das pessoas honestas, os
preconceitos ou as superstições do povo" de modo a agradarem ao maior
número de pessoas. O seu objectivo principal era agradar de forma a obterem os seus
proveitos próprios, sem atenção aos valores essenciais. Daí o uso artificioso da
oratória e da retórica como forma precisamente de, através da palavra, conseguir
persuadir os cidadãos.
Pelo contrário, como diz Bonnard (1980: 442) "Sócrates
quer educar o seu povo, conduzi-lo à consciência do seu verdadeiro bem, ao perigo e à
nobreza da escolha. Quer libertá-lo da servil obediência à opinião estabelecida, para
o comprometer no livre serviço da verdade severamente verificada. Quer tirá-lo da
infância, que pensa e age por imitação e constrangimento, para fazer dele um povo
adulto, capaz de agir por razão, de praticar a virtude não por temor das leis e do poder
(ou de deuses ao seu dispor), mas porque sabe de ciência certa que a felicidade é
idêntica à virtude" .
Sócrates acreditava que se,
através do seu método, conseguisse levar as pessoas a descobrirem o que é a aretê, então esta descoberta obrigaria os
seus interlocutores a agir de forma virtuosa. No Protágoras, a pergunta pela ensinabilidade da virtude é central . Pode a
virtude ser ensinada? O ponto curioso deste diálogo é que, na primeira fase da
discussão, Sócrates dúvida que a virtude possa ser ensinada, enquanto Protágoras, como
sofista, entende que sim. Mas, no decorrer da argumentação, Sócrates vai analisar as
várias virtudes e conclui que todas elas são uma única, que todas se identificam com o
conhecimento do Bem. Nesse momento, acaba por concluir que a virtude pode ser ensinada e
é Protágoras quem passa a considerar duvidosa esse possibilidade.
Uma outra diferença
fundamental separa Sócrates dos Sofistas. É que, enquanto aqueles se consideravam
sábios, profundamente conhecedores de várias matérias, e, justamente por essa razão,
se faziam pagar pelos seus ensinamentos, Sócrates defendia aquela fórmula tão
célebre quanto enigmática pela qual ficou para sempre conhecido:
"Só sei que nada sei"
Sócrates combateu os
sofistas, julgou com severidade o uso que faziam da arte da palavra, que segundo ele não
visava estabelecer o verdadeiro mas produzir a aparência. Sócrates defendia
energicamente a necessidade e a possibilidade de conhecer a verdade. Amava-a acima de tudo
e tomou como ocupação exclusiva da sua vida, ajudar a descobrir em cada homem a verdade
que nele existia. Mesmo sem salário e quase sem esperança, exerceu até à morte
este serviço de educador do seu povo, o mais insubmisso de todos os povos. É esta a sua
maneira de ser cidadão.
Mas, os cidadãos atenienses não
souberam compreender Sócrates. Ele amava a juventude. Amava a sua cidade. Foi por
ela que viveu e foi por ela que consentiu morrer.
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